sábado, 9 de maio de 2015

O caso da gasolina e o por que de o Estado interventor onerar excessivamente a vida do cidadão.

Passado o frisson nacional sobre a questão de petrolão e corrupção na Petrobrás, passei a refletir sobre a supervalorização que eu, você e 99% das pessoas damos à empresa estatal e às falácias que repetem por aí dia após dia.

Resolvi escrever esse post pra te mostrar que muito do que falam por aí é mito e, geralmente, vendem um peixe maior do que realmente aquele pescado.

Vamos lá...

Primeiro a noção jurídica: no Brasil, vender gasolina pura é crime. Segundo a Lei 8.176/1991, o proprietário de um posto de combustíveis que queira comercializar gasolina com qualquer mistura além daquela prevista em lei pode ser preso de um a cinco anos. É um crime contra a "ordem econômica". 

Só pra você saber, a gasolina atualmente permitida no Brasil para comércio conta com percentual de 27% de álcool anidro. Lobby à parte, os 2% de diferença entre o que era permitido até março de 2015 (25%) e o que valor de hoje (27%) gera um aumento de demanda pras indústrias açucareiras de aproximadamente 1 bilhão de reais por ano. E a parte mais engraçada da história é que esse aumento (de percentual de etanol) aconteceu somente na gasolina mais vendida, a comum, a premium (normalmente 10 ou 15 centavos mais cara por litro) continua com a mesma concentração de antes (os mesmos 25%). 

Um pequeno parentese: se seu carro não é flex e você gosta do seu motor, passe a utilizar somente a gasolina premium. Nosso Governo maravilhoso sequer realizou testes com motores puros de gasolina sob a argumentação de que os carros flex se popularizaram tanto que não justificaria. Simplesmente não existem estudos (chancelados pelo Governo, claro) que garantam a segurança e o bom funcionamento de motores monocombustíveis com a nova proporção de gasolina e etanol.

O Governo justifica esse aumento de concentração de etanol por litro de gasolina em "estudos", afirmando que a presença de etanol aumenta a octanagem da gasolina. Concordo, realmente aumenta. Mas cá entre nós, isso não te remete àquela política da década de 1970, o chamado Proalcool? Será que a indústria da cana de açúcar, tão necessária naquela época, não impõe esse tipo de medida pra manter a produtividade até hoje?

Talvez você não saiba, mas o petróleo extraído das profundezas se divide em dois tipos: "pesado" e "leve". O senso comum nos indicaria que o "pesado" é aquele mais consistente, mais poderoso e o leve, aquele mais simples. Errado! A grosso modo, os termos indicam a facilidade e, consequentemente menores cursos de transformação do petróleo em outros produtos, dentre eles a gasolina.

Os países árabes,  por exemplo, além de possuírem as maiores reservas de petróleo do mundo, possuem as maiores reservas de petróleo leve, ou seja, além do combustível ser extremamente abundante, sua extração é barata e substancialmente mais simples que para outros países. É por isso que Arábia Saudita, Irã, Kwait, Emirados Árabes, Iraque e outros deitam e rolam no mercado internacional.

Por outro lado, o petróleo brasileiro é do tipo pesado e, pelos fatores acima mencionados, é usualmente utilizado para fazer asfalto e outros combustíveis menos refinados, como o utilizado em máquinas, por exemplo.

Não precisa ser um gênio pra afirmar que, no cenário atual, o petróleo brasileiro jamais fará frente ao árabe, por exemplo, seja em termos de qualidade ou de custo e preço.

O próprio Pré-Sal, famigerado milagre pré eleitoral que de repente caiu no ostracismo, foi tido como potencialmente inviável na conjuntura recente do mercado internacional de petróleo. Era daí que o país tiraria o tão precioso petróleo leve. Mas supondo que o investimento traga retorno, alguém realmente acha que as vantagens e facilidades serão refletidas no preço final?

Raciocínio lógico então: se é caro e difícil transformar o petróleo brasileiro em gasolina de qualidade, quer dizer que a gasolina que utilizamos todos os dias é proveniente de onde? A resposta inconveniente: ela é, em grande parte, importada.

Diversos sites noticiam periodicamente o aumento das importações ano após ano. Dúvidas? Aqui, aqui e aqui. Viram? E olha que eu fiz uma pesquisa bem vagabunda no Google.

Concluímos, portanto, que não somos (nem nunca fomos) auto-suficientes no Petróleo, ao contrário do que te falam por aí.

A própria Graça Foster, aquela querida, afirmou categoricamente que em 2015 a Petrobrás iria cortar investimentos na exploração de petróleo ao "mínimo necessário". Ora, convenhamos, se não vai extrair e continuamos com combustível nos postos, logo inferimos que em algum lugar do mundo existe alguém produzindo a gasolina que nós consumimos, certo? Até onde sei, e me corrijam se estiver errado, é impossível produzir gasolina sem extrair petróleo.

É esse o ponto onde quero chegar: recentemente a Petrobrás, a contrariu sensu com o que faz mês após mês no Brasil, baixou o preço da gasolina no Paraguai. Enquanto nós, brasileiros, abastecemos pagando uma média de R$ 3,291 (esse é a média de preço nacional disponibilizada pela ANP em  09 de maio de 2015. Dúvidas, consulte). Ao mesmo tempo, o mesmo combustível em terras paraguaias custa em média 4.290 guaranis, ou, na cotação atual, cerca de R$ 2,543 (de novo, valor apurado em 09 de maio de 2015).

Mesmo combustível, mesma quantidade e a assustadora diferença de praticamente R$ 0,75 por litro.

Assustador, não? Na verdade o que me assusta mesmo é a justificativa da Petrobrás pra isso. A empresa afirma pra quem quiser ouvir que a redução é possível por conta do mercado de distribuição de combustíveis no país.

Ora, mas por que então aqui no Brasil não é possível fazer isso?

Simples: a carga tributária incidente na gasolina chega a assustadores 53%. Ao abastecer você paga ao governo PIS, COFINS, ICMS, CIDE, sem contar com os impostos de toda a cadeia produtiva do combustível. Numa conta rasa, com o litro custando R$ 3,29 como dito acima, R$ 1,74 são destinados a cobrir impostos. Enchendo um tanque de combustível de 45 litros, por exemplo, você paga R$ 78,47 de impostos.

Ah, mas além dos impostos, qual a culpa do pobre coitado do Governo quanto a isso?

Você sabia que no Brasil é proibida a produção de carros de passeio (falo de automóveis pequenos) movidos a diesel desde a década de 1970? E que somos o único país a fazer isso? E que em outros países temos grandes índices de veículos de passeio movidos a diesel? Na Europa 50% dos veículos de passeio são movidos à diesel, segundo a ACEA (European Automobile Manufacturers Association). E que carros a diesel chegam a ser até 30% mais econômicos que os movidos a gasolina?

Não tá satisfeito? Ok... A culpa é do mercado internacional, já que temos de importar e... E se eu te contar que o preço da gasolina nos EUA hoje (na verdade em abril de 2015) está mais barato que em 2006? Aqui no Brasil, só pra você comparar, o preço médio da gasolina era de R$ 2,595 em abril de 2006.

Voltando à primeira linha do texto, volto a indagar: por que apoiar a Petrobrás com toda essa crise vexatória que a empresa vem passando? Não faz nenhum sentido.

Isso a própria Constituição Federal esclarece, olha só:

Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra.

Então, meu amigo, venha Petrobrás ou permaneça nessa balbúrdia que hoje existe, o petróleo pertence à União e não à Petrobrás. Se a empresa falir, fechar ou simplesmente parar de produzir o combustível, paciência. Cessada esse ufanismo babaca de que "salvar o petróleo nacional está vinculado à manutenção da Petrobrás", ainda que a empresa quebre, logo logo surge outra mais moderna, eficiente, honesta e, não me matem, privada.

Não caia nessa.

Hoje pagamos caro na gasolina pra bancar a maracutaia na Petrobrás, financiar campanhas políticas e diversos outros absurdos ainda maiores e que estão escondidos do público em geral. Além disso, a imposição do preço atrelado ao valor do etanol é outra forma de atender aos anseios dos grandes produtores de cana de açúcar. Estamos pagando esta dívida histórica do Governo com eles (lembre-se da diferença de lucro que terão com o acréscimo imposto pelo Estado de 2% de concentração de etanol por litro de gasolina).

Por fim, ainda não me mostraram uma só justificativa além da carga tributária pro combustível em território nacional custar cerca de setenta e cinco centavos por litro mais caro que o mesmo combustível exportado para países vizinhos. Mas tudo bem, vivemos num país em que vender gasolina é crime mas vender com um quarto de etanol misturado é estar na lei.

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