Fui criado com concepções ortodoxas sobre o amor.
Pra mim, esse sentimento era uma coisa pra lá de piegas, naquele conceito de que grandes amores nascem, crescem e morrem juntos. Tudo resumido naquela infindável vida em casal - sem necessariamente ser conjugal, que fique claro, mesmo porque, amor não diz respeito apenas à relação amorosa e carnal entre homens e mulheres, mulheres e mulheres, homens e homens. Não que piegas seja uma coisa ruim, só quis dizer que minha concepção sobre amor destoa em muito da efemeridade que minha geração lida com as coisas.
Até hoje, quando paro pra pensar em amor e relacionamentos, me vem à cabeça aquela música do Raul Seixas, "Tu és o MDC da minha vida". O amor está nas banalidades compartilhadas, nas coisas pequenas que você só compartilha com aquela pessoa. Nas pequenas lembranças, nas situações cotidianas que te fazem lembrar da outra pessoa e que, pros outros, não significam absolutamente nada.
É o que Raul diz em diversos trechos dessa música, tida por muitos como brega e uma simples brincadeira do cantor. Eu não penso assim.
E assim tentei levar minha vida desde sempre. Que seja eterno enquanto dure é um termo que não descreve com precisão, mas indica a intensidade com que devemos levar as coisas.
Acho que a partir do momento em que você desfruta da companhia de uma pessoa, você está disposto ao pacote completo. As partes boas e as partes ruins. E é isso que a música descreve com precisão. Você sai do "não posso sentir cheiro de lasanha/me lembro logo das Casas da Banha/onde íamos nos divertir" até o "dia em que você entrou num bode/quebrou minha vitrola e minha coleção de Pink Floyd".
E é exatamente isso. Pessoas têm problemas. Pessoas têm momentos bons. Assimilar isso é necessário. Indispensável.
O problema é que nem sempre as coisas são pra sempre. E aí vai a lição que, invariavelmente, precisamos aprender: tudo vai embora, uma hora ou outra.
Por que diabos isso seria importante? Respondo: porque, em geral, o sentimento não muda. O que muda é a sua disposição em levar aquilo adiante. Quem sente sua falta de verdade não sente mais ou menos por isso ou aquilo. Essencialmente quando falamos de pessoas que marcam nossa vida.
Quando a pessoa é realmente importante pra você, não é o fato de estar sem ela que impede de se lembrar. Pelo contrário. Quando é marcante, todo e qualquer lugar te remete àquela relação. Sejam lembranças boas, ruins ou banais. Como dito antes, da lasanha que lembra momentos bons, à briga que resultou na quebra da vitrola. Até um simples chaveiro, como diz a música. Pra quem está de fora, nada disso é marcante (talvez apenas pra dar aqueles conselhos de "se separa dessa louca, olha o que ela fez com tua vitrola!"), mas pra quem vive... Não tem como se desligar dessas lembranças e, fazê-lo, creio, não seria nem ao menos saudável.
Volta e meia uma pausa pode até ser importante pra não deixar aquilo morrer.
Até por isso, penso que a ausência pode ser importante. Desapegar, ainda que por pouco tempo. Lembrar de uma situação pode ser melhor do que simplesmente tolerar aquilo por muito tempo, até mesmo pra te ajudar a ter outra perspectiva sobre as coisas. Mesmo porque, muitas pessoas precisam daquilo que se chama "ficar sozinho". Ficam sozinhos até perceberem o quão supervalorizavam a solidão. Ou não, e aí está um grande risco.
Ignore a solidão, conviva ou até desfrute dela. A escolha é sua. Mas saiba aproveitar esses momentos, até porque as inseguranças, medos, brigas sempre vão existir. Faça digestão dos momentos bons, aquelas lembranças que embargam sua voz e te remetem ao que realmente vale a pena. Saber pesar isso é indispensável na vida a dois. Mas também reviva os momentos ruins, eles acrescentam mais do que podemos imaginar.
Sinta falta, lembre-se dos momentos bons, mas também daqueles ruins. Porque é exatamente a soma de bagagens de uma relação que a leva ao ponto de ser marcante. Esqueça tão somente das interferências externas: esse aprendizado tem de ser seu. Não é substituindo alguém que você vai conseguir superar nada. Nada na vida é simples assim e pessoas não são descartáveis, embora se tratem assim.
Viva na intensidade das coisas. Certo que a espera será recompensada. Viva aquilo e não se arrependa, já que não sabemos do amanhã, de como diabos as coisas vão ser.
Na maioria dos casos, não sabemos nem mesmo o que queremos.
Fica de bônus a inspiração: Tu és o MDC da minha vida - Raul Seixas
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